No piloto automático

21 de setembro de 2020 0 Por Leandro Marçal

Nunca gostei de dirigir. Mesmo quando tinha um carro, não era fã da atenção absoluta no trânsito, alternando o olhar nos retrovisores, mexendo os pés nos pedais do acelerador, embreagem e freio. Me sinto pressionado e com medo de errar, fico ainda mais ansioso. Eu sei, muita gente ama dirigir e isso não é um manifesto contra o transporte individual. Eu só não gosto de dirigir, sempre prefiro ser o carona.

Há algum tempo, cheguei a sonhar com um piloto automático. Eu colocaria o destino e o carro faria o resto. Poderia ler um livro enquanto a máquina se preocupasse com as paradas nos semáforos e faixas de pedestres. Responderia mensagens no celular e o veículo respeitaria os limites de velocidade e imprevistos do trânsito. Se tivesse reclamações e perigo de briga, eu culparia a lataria, não seria falha do meu cérebro no meio da ingrata tarefa de seguir princípios da mecânica para ir de um ponto a outro.

Desisti do sonho. No máximo, dá para contar com carros bem modernos, capazes de fazer a troca de marchas no meu lugar. Neles, o motorista se preocupa com os pés no acelerador e no freio. Nesses casos, a embreagem foi gentilmente convidada a se retirar. Sem cordialidade, a tecnologia não é conhecida por ser muito educada.

O sonho do piloto automático já virou pesadelo, mas não dentro de um carro. Já vivi no piloto automático, sem saber para onde ir. Eu só ia. Não me importava com o caminho, andava sem saber se chegaria a algum destino. Indicavam uma curva, eu virava. Nem me importava se era fechada ou perigosa, só girava o volante sem dar seta. Nas linhas retas, não tinha pudor em cochilar com a testa no volante. Me sentia obrigado a seguir em frente, mesmo acidentado.

O piloto automático é uma armadilha. Chega sem avisar e pode ser pior que ficar estacionado. Se não retomo a direção e tomo a responsabilidade de acelerar e frear na hora certa, tomo multas e sou recolhido para um pátio com outros infratores.

Para ser sincero, eu preferia um transporte público de qualidade. Cada um no seu espaço, sem ficar muito tempo esperando no ponto, descendo as escadas e andando pouco até o destino. Mas não tem jeito. Tem horas que só eu posso conduzir a caranga. De moto, até dá para chegar mais rápido, mas o risco de nem chegar é alto e não sou um fã de pegar atalho nos corredores.

Agora, até consigo andar para frente. Devagarinho, sem fazer barulho, apertar a buzina e xingar quem faz barbeiragens no meu caminho. Não quero chamar atenção e respeito os limites da minha velocidade. Passei um tempo estacionado e depois uns bons meses no piloto automático. Agora presto mais atenção no trânsito, sem tirar os olhos dos retrovisores para não ser pego de surpresa. Quando falho, me cobro pouco e lembro que não sou piloto profissional.

Dirigir não é fácil. Quando o assunto é carro, continuo preferindo ser carona. Em outros casos, não tenho como terceirizar a condução. Vou em frente. Tenho muitos quilômetros rodados e um caminho longo a percorrer.