Moço, peço licença

29 de maio de 2020 3 Por Leandro Marçal

Foi na semana passada, ou na retrasada. As semanas não fazem diferença essas semanas, e por mais umas boas semanas. Zapeava pelos canais de TV por assinatura e me deparei com uma live do Marcelo Falcão, ex-vocalista do Rappa. Lembrei os tempos de shows da banda.

O grupo criado no WhatsApp, a compra dos ingressos pela internet no cartão de crédito de quem tinha crédito, quem vai?, eu vou, eu quero ir, vai aumentar no segundo lote, vou pensar, eu vou, tá mais caro, puta merda!, paciência, vai mesmo?, alguém tem contato pra alugar uma van?, procura aí, eu tenho, fala com esse cara, o preço, vai sair uns 50 reais pra cada um, mais o ingresso?, mais o ingresso, quem vai?, peraí, vâmo lotar a van, fica mais barato, eu vou, o Jorge Thiago, a Kailane, e o Bruno, qual Bruno?, o Bruninho de São Vicente, quem mais?, o outro Bruno de São Vicente,  a namorada dele vai?, vai!, quem mais?, o Rafael, a Karine, o Mucio, o Ilek, o Cachapel, qual o nome do Cachapel?, não sei, só sei que ele é o Cachapel, a mina dele, o Salada, minha irmã, meu cunhado, o Vinícius, o Edu, o Gabriel, e de Guarujá?, quem mais?, o Douglas, o Bruno Japa, o Lê, a Letícia, o Thierri, o Thales, o Rafinha, a Camila, o Adriano, a Monike, o Gui, o David, a Pri, a Mayara, o Gu, pronto, fechou, tem a van, vão comprar cerveja pra beber no caminho?, vâmo, catuaba e energético também, a van sai da praça na esquina de casa, para no posto da balsa, de lá saímos com o pessoal do Guarujá, pode passar na minha casa também?, pode, é caminho, que gente folgada, dá muita dor de cabeça alugar van, na próxima vocês se viram, e vâmo, e conta história, e fala isso, e fala aquilo, e será que vão cantar essa?, e aquela?, muda a música aí, motô!, evito beber com medo de me dar vontade de mijar no meio do caminho, não comi muito com medo de ter que mais que mijar no meio do caminho e longe de casa, tá perto?, tá chegando, tá pertinho, chegâmo, a gente encontra o cara da van aqui, beleza?, beleza, anota o número, anotaram?, anotei, eu também, beleza, vâmo, entrâmo, olha esse lugar, grande, tá tocando uma música, um rap, um reggae, eu falei pra não ter medo porque ia dar tempo e não tinha como chegar atrasado, e outra música, e mais uma, e falam que já já começa, e podia começar logo, e calma, e bebe uma cerveja, vou ao banheiro, volto, nada?, nada, uma fumaceira, que fumaceira, olha o palco, dá pra ver o palco, e escurece, e vai começar, e eu pergunto pro Jorge Thiago e pro Bruninho com qual música vão começar, eu digo que vou ganhar porque sempre ganho porque vi onde começou no show da semana passada, e eu acerto, e eu erro, e todo mundo erra, será que vai cantar aquela outra?, vai, e todo mundo olhando pro palco, Jorge, ele tem que sair do banquinho, não é MPB, calma, ele vai sair, saiu, agitou, gritou, pularam, não gosto de pular, eu operei a coluna, canta, canta, canta, uma hora, duas horas, quase três horas, naquele show do semestre passado ele  cantou três horas, quantos?, esse é o décimo oitavo show que a gente vai, e eu penso que gosto do Rappa, mas gosto mais de estar junto com a galera que gosta do Rappa, os shows passam, penso que um dia isso vai acabar, sou pessimista, eles vão parar, será?, vão, eu li na Folha, duvido, vão sim, vâmo voltando pra casa, uma galera para no posto, outros param em Santos, eu paro em casa, já é de manhã, eles vão parar, pararam, valeu rapaziada, vocês são foda, os caras são foda, tomara que não parem, pararam, nós continuamos, passa o tempo, ligo a TV, tá rolando a live, lembro isso tudo.

 Fomos felizes. E sabíamos.