Três viajantes

7 de janeiro de 2019 0 Por Leandro Marçal
“É necessário sair da ilha para ver a ilha, não nos vemos se não saímos de nós.” – Trecho do livro O conto da ilha desconhecida, do escritor português José Saramago

L. teve uma ideia genial. Chamou D. e B., seus amigos mais próximos, e expôs o plano mirabolante: atravessariam o continente até chegar à ilha secreta, na qual se escondia um tesouro de valor incalculável. Era comum ver L., D. e B. juntos para lá e para cá. Um trio inseparável, comentado pela cidade.

Com um mapa na mesa, caneta e lápis nas mãos, L. traçou a rota. Para chegarem ao outro lado da travessia, teriam que seguir este e aquele caminho. Explicou o funcionamento da bússola, apostava nas habilidades de remar de B. e na especialidade de D. sentir o tempo da água se acalmar. Não tinha como dar errado. Mesmo com medo, toparam a jornada. Ninguém poderia abandonar o barco. Se um caísse na água, os outros o salvariam. Se um afundasse, todos afundariam. B. criava lemas de autoajuda.

A missão de L. era conseguir as ferramentas necessárias para a viagem. Antes da partida, levou suprimentos, coletes salva-vidas e tudo que precisavam. As famílias dos viajantes estavam orgulhosas dos planos ambiciosos.

E começaram a remar, remar. Até passar das primeiras ondas, os três estavam empolgados. B. e D. discutiam para sincronizar a velocidade das remadas, L. manipulava a bússola. Olhava o mapa, sentia a direção do vento. D. ouvia as instruções, sentia vergonha de discordar a cada balanço do barco. B. remava contrariado, mas não levou a própria bússola, tampouco sabia interpretar mapas.

Alto-mar. O caminho até o continente dourado era longo. Frio e chuva. Revezavam no uso de baldes para tirar água do barco. L. não tinha habilidades físicas. D. remava mais lentamente ao pensar nos problemas deixados em terra. B. reclamava, dizia fazer mais força que os outros dois.

Quando a tempestade começou, o barco balançava de um lado para o outro. Sentiam medo de morrer afogados. L. levou um colete reserva para cada um e já previa o afundamento do barco, mas ficou quieto. B. não gostou daquele modelo, preferia coletes amarelos. D. não sabia como amarrar o equipamento no corpo em caso de emergência, mas não se preocupou em perguntar como fazê-lo.

A tempestade se acalmava quando B. sugeriu que os outros dois descansassem um pouco. Ao acordarem, L. e D. notaram seu sumiço e o de dois coletes salva-vidas. B., muito esperto, usou o rádio para pedir ajuda à sua família na madrugada. Àquela hora, já aproveitava a água quente e a sopa da mãe. Em terra, repetia a incompetência de L. e D. para levar o barco adiante.

Os dois perceberam que não daria para chegar à ilha do tesouro. Resolveram voltar para casa. Remaram em sincronia por um dia inteiro. D. repetia, a cada remada, a gratidão e reconhecimento pelo planejamento minucioso de L., mesmo que não tenha dado certo. Sua busca por mapas, bússolas, coletes e remos não seria em vão. L. desconfiava.

Dormiram. Quando L. acordou, viu um bilhete escrito por D.: “a equipe de resgate passou de madrugada e você não acordou, só cabia um de nós no bote. Voltarei em breve para te resgatar”.

D. voltou e encontrou o barco vazio. Ficou muito irritado com L.: ele se jogou no mar. Morreu afogado. B. chorou e o acusou de fraqueza, D. lamentou a falta de paciência de L., cujo corpo nunca foi encontrado.