Palavras são palavras
Demorei anos para comprovar que muitas frases de efeito do meu pai eram bordões de personagens do Chico Anysio. Trabalhando de casa, é comum deixar a televisão ligada para me fazer companhia. O canal por assinatura dedicado às reprises e aos clássicos dá um alívio, faz barulho, relembra outros tempos, mostra que a vida pode ser bela até nas esquisitices do passado.
Outro dia, ouvi: palavras são palavras, nada mais que palavras. Escutei muitas vezes, na voz do meu pai, essa estranha mistura de autoajuda requentada com falta de confiança nas pessoas. É do Walfrido Canavieira, que nas palavras de seu criador, “(…) já foi prefeito de Chico City e hoje é o síndico do prédio onde mora no Rio de Janeiro. Irmão do ilustre e decente professor Raimundo Nonato, Canavieira é seu oposto, apesar dos dois serem mestres. A diferença é que enquanto Raimundo ensina bons e nobres conhecimentos, Walfrido é professor de safadeza e mestre em levar vantagem em tudo que faz.”
Um tipo comum. Mais comum que o saudável para a coletividade brasileira.
Sempre ao lado do secretário Almeidinha, finalizava um quadro com sua frase debochada, nos lembrando que nesse mundo burocrático, nessa sociedade capitalista, nessa convivência desconfiada, vale mesmo o que está no papel. De preferência, com assinatura registrada em cartório, com duas ou três vias. Para a sua segurança, vai que…
Palavras são palavras, nada mais que palavras. A palavra ausente, muda e omissa; quieta para não se posicionar, para não se queimar, para manter uma imagem boa politicamente, limpinha, cheirosa e desinfetada; ausente pela não presença de quem já se foi e só se ouve com a memória. A palavra dita, impossível de voltar atrás, como a flecha lançada e a oportunidade perdida daquela parábola meio clichê, meio real; capaz de nos ferir como faca e outras armas de todas as cores; incapaz de ser esquecida, porque pronunciada, um caminho só de ida.
Sou homem de palavra, diz meu pai. Assim também dizem outros homens, mesmo aqueles de poucas palavras, mesmo aqueles sem nenhuma palavra. Quem não tem palavra não tem nada, repete meu pai, que quase não mente. Ter palavra é cumprir a palavra até o fim, até as últimas consequências. Mesmo que para isso sejam feitos sacrifícios. No máximo (vá lá, ninguém é de ferro, ninguém é infalível, ninguém é perfeito), com um aviso: não posso cumprir minha palavra, não vou conseguir, me desculpa, está além do meu alcance, perdi o controle.
A palavra vazia, impossível de acreditar; que não vale a pena ser rebatida; que causa discussões de tão absurda. A palavra sem curvas; que não exige garantias porque a própria palavra é a garantia; que não precisa de papéis; que não exige temores; que dispensa cobranças.
As palavras. Nada mais que palavras.
Falando em palavras, no meu serviço um cara que tem uma síndrome não tão rara de que tudo que acontece no ambiente de trabalho é com ele, sobre ele ou contra ele… me confrontou diante do encarregado, afirmando que disse palavras que não disse, enfim como eu nunca colho oque não planto, ele tomou uma “encarcada” e pediu demissão em seguida kkkkkkk, ótimo final de semana por sinal