Open bar

20 de julho de 2019 0 Por Leandro Marçal

A banda dos integrantes com roupas coloridas tocava uma música da moda. Parecia sertanejo universitário. Eu nunca tinha ouvido aquilo. Segurava uma latinha com um resto de cerveja e esperava o pessoal voltar com mais bebidas. Ao meu redor, muita gente se esgoelava para entoar o refrão sobre ostentação, uísque e carros de luxo. Abraços, bebidas em grandes baldes com gelo e vídeos para câmeras frontais completavam o cenário.

Quando me despedi do pessoal, dispensei a carona e esperei o carro do aplicativo chegar. Uma mulher de vestido branco tropeçou em mim e pediu desculpas. Carregava a amiga que se apoiou no poste antes de vomitar. Mais adiante, os amigos de 18 ou 19 anos falavam alto antes de entrar no carro de luxo. Um deles bateu a porta com força. Ouvi xingamentos e o pneu fritando. Fiquei preocupado.

Calado, via pessoas dormindo sobre pedaços de papelão pelas ruas, embaixo de toldos e viadutos. O motorista do aplicativo reclamou dos viciados em crack, perambulando feito zumbis. Um absurdo e ninguém faz nada, prosseguiu. Pra piorar, não tem emprego, tinha que dirigir mais de 12 horas por dia dirigindo se quisesse pagar as contas e tomar uma cervejinha, completou.

Fingi concordar para não puxar assunto. Os reflexos me deixavam na mão depois da balada open bar. Não fosse a insistência do aniversariante, teria ficado em casa. Não me encaixo em multidões.

Deslizava a tela do celular entre notícias e me espantei ao ler que a principal dependência química entre moradores de rua é o alcoolismo, o dobro da droga ilícita odiada pelo motorista do aplicativo. Ele vociferava contra a maconha como porta de entrada para todas as drogas e eu lia outra estatística: 3,3 milhões de pessoas morrem anualmente pelas consequências do álcool no mundo.

Era provável que no dia seguinte eu sentisse uma delas: a ressaca. De folga, precisaria tomar um remédio contra dores de cabeça para chegar a tempo ao inadiável almoço de domingo na casa dos meus pais. Paguei a corrida e subi até meu apartamento. Vi a cama arrumada e pensei em um bom motivo para ter adiado outra vez a noite de filmes com aquela garota.

Deitei, senti um incômodo na barriga. Quando acordei, perdi algum tempo vendo as postagens sobre o álcool acima de tudo e as curtidas acima de todos. Pensei no vômito na calçada e nos pneus fritando. Perguntei se o aniversariante havia chegado são e salvo. Ele não tinha condições de dirigir, mas dirigiu.

Minha ressaca parece não ter fim.