Inveja*
*Mais um conto escrito por mim há alguns anos, com um protagonista homem e problemático, temática recorrente na minha ficção.
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Foi rápido, os mais velhos dormiam e os mais novos aproveitavam as baladas nos arredores. Meu banho era a penúltima etapa de um dia atribulado e de lá encontraria minha noiva no quarto, em um dos raros momentos a sós naqueles dias. Fomos convidados a passar o fim de semana na colônia de férias pelo Denis, que programou o feriado com a Cris e achou que seria uma boa oportunidade pra amenizar o clima pesado dos últimos meses entre mim e a Sandra.
Me convidou em um almoço de sexta-feira, quando damos risadas dos destinos enfadonhos do pessoal da época da escola e falamos mal dos familiares e colegas de serviço. Trabalhamos perto um do outro em empresas grandes e com muitos benefícios, por isso é comum trocarmos mensagens pra gastar um pouco mais do vale-refeição antes do fim de semana. Sua vida andava bem. Como de costume, tudo dava certo pro Denis e ele era assunto nas conversas de outros amigos, como exemplo de alguém bem-sucedido da nossa geração.
Uns separados, outros frustrados, havia aqueles fugindo de decisões judiciais e o Denis não. Superou bem o término de relacionamentos anteriores e quando engatou o namoro com a Cris ficou na cara que daria certo. Foi subindo na empresa e chegou a emprestar dinheiro sem cobrar juros de quem precisava, como eu, quando fiz uma obra no apartamento.
Entre os chuveiros, havia uma divisória ótima pra espantar os manja rola de banheiros públicos. Eu, mesmo, sempre me senti constrangido de tomar banho depois de jogos no society e dava uma desculpa pra ir embora logo. Não que eu faça vergonha com meu pinto, mas a comparação leva um monte de podridão pra cabeça e começamos a duvidar de nossas habilidades.
Como disse, foi rápido, éramos só nós ali, só eu e o Denis e ele perguntou se a Sandra tinha comentado sobre avançarmos uma casa no jogo dos relacionamentos e morarmos juntos. Pensei em responder que não deu tempo por tanta coisa que fizemos ali, entre trilhas, sol na cabeça, interação com outros funcionários antigos perguntando há quanto tempo eu trabalhava na empresa e eu respondendo que era apenas convidado de um amigo. Foi tão rápido que mal pude transformar os pensamentos em palavras pra atualizar quem sempre me ouve.
Ficou só o barulho dos últimos pingos caindo no chão, enquanto o Denis andava até o meio do vestiário e se enxugava na frente do meu chuveiro. Assim, sem constrangimento. Éramos só nós, que nos conhecemos desde o Ensino Médio. Tanto tempo e eu nunca tinha visto ele assim, sem nada.
Não que eu tenha sentido desejo, longe disso, mas naqueles poucos segundos passei a entender melhor os motivos que sempre levaram o Denis a se dar bem em tudo. Nunca falei que o achava bonito, até porque pega mal, mas sua presença chama atenção e atrai olhares das mulheres e dos enrustidos. Atrairia ainda mais se o vissem assim, como eu vi, sem nada. Não apenas com o braço magro, porém definido, peito e abdômen riscado, com uma saliência na panturrilha ressaltada por seus poucos pelos nas pernas.
É que seu pau era grande e chamativo, bem maior que a média. Me fez olhar pra baixo na hora pra comparar a diferença entre o que ele carregava e a minha normalidade. Senti vergonha pelos dias em que me contentei por estar ali, dentro do normal, depois de ler matérias em revistas pornográficas e encolher a barriga pra medir desde a base, como num teste pra saber se era okay ou pequeno, já que grande sempre soube que não era. Desde cedo, me contentei com o meu e nunca ninguém reclamou. Quer dizer, umas ex e a própria Sandra já reclamaram, mas de outras coisas, nunca do tamanho, reclamaram por gozar rápido demais ou ir com muita força no bate-estaca. Nunca tive o desprazer de ter meu pau recebido a gargalhadas quando tirei as calças, qualquer motivo pra me sentir desanimado no sexo tinha a ver com habilidade e performance, que vim aprimorando com o tempo e a prática.
O Denis, não. Ali, tive a certeza de que todas as minas que ele comeu na escola, na faculdade, as ex-namoradas e a própria Cris, tiveram ainda mais expectativa e desejo tão logo ele arriou as calças e deixou à vista aquele monumento. Duro, ainda por cima. Não vi assim. Sou hetero, gosto de mulher, mas pensando bem, tive a sincera curiosidade de saber como ele se comportaria com aquilo tudo erguido, como seria capaz de aguentar tanto sangue descendo. Um braço, um poste, uma torre. Um pau de verdade, não mera gíria pra se referir ao pênis, mas um membro grande que quando enrijecido causaria estragos com quem o encarasse sem o devido preparo. Se dizem que Deus não dá asa a cobras, o pau do Denis está com a pessoa certa, tão gente boa, que não abusa desse poder, enquanto outros teriam espalhado o dom divino pra melhorar a fama.
Eu poderia ter passado anos em academias puxando ferro e tomando bombas pra ter o braço maior que o do Denis, ter feito mil abdominais diários antes de dormir pra ter mais riscos na barriga do que ele, corrido maratonas de tempos em tempos pra ficar com a perna mais preparada que a dele se soubesse que fisicamente estaria em desvantagem por anos e anos, ter tido a sorte de entrar no trabalho certo e conhecer a pessoa certa pra não ter problemas e viver pisando em certezas. Mas o pau, não. Aqueles e-mails pra crescer cinco centímetros são mentirosos e chamam vírus que eu já dei a desculpa de pegar em sites pornográficos e baixando filmes piratas. Nunca ganharia dele no quesito piroca.
Tanto tempo de amizade com o Denis e eu até suspeitava que ele deveria ter o negócio grande. Sabia que era maior que o meu, mas não tanto assim. Conheço meu corpo e a média do brasileiro. Mas aquela foi a maior tromba que vi na vida. Coisa de ator pornô, mesmo, desses que ficamos na dúvida se não usam prótese e temos pena da mulher que aguenta tanta coisa em tão pouco espaço no corpo.
O motivo da Cris estar sempre sorridente e dele ser meu melhor conselheiro tava ali, pendurado, olhando pro chão antes de ser coberto por sua cueca box vermelha, que ele diz dar sorte e só usar em momentos especiais. Talvez o nome Denis não fosse mera coincidência, mas a rima perfeita. Será que a inveja dos amigos da nossa geração foi porque já passaram pela mesma experiência que eu em algum banheiro coletivo? Muito além do emprego estável e do relacionamento com cara de ser pra vida inteira, sua rola era motivo de sucesso, mesmo que ele viesse a ter problemas pra pagar as contas de luz e água. Humilde, nunca falou disso pra ninguém, nem contou vantagens por ser pica grossa além da força de expressão.
Foi rápido, foi muito rápido. Denis vestiu a cueca e ia colocando a bermuda enquanto eu ainda pensava no gigantismo daqueles poucos segundos. Falei que tentaria conversar naquela noite e ele me desejou boa sorte e boa noite. Antes de sair do banheiro, me recomendou fazer um amorzinho pra só então puxar o assunto de morarmos juntos, porque uma discussão poderia irritar a Sandra e eu dormiria com a companhia da mão direita. Amorzinho. Deve ter sido ironia o uso do diminutivo.
Combinamos de tomar café umas oito e meia. E mesmo que a Sandra brigasse comigo, não teria problemas, de tão curioso que fiquei pra ouvir gemidos da Cris no quarto vizinho com um copo entre a parede e a minha orelha. O Denis certamente não tinha problemas de dormir no sofá ou na seca.
Transamos. E teria sido uma das nossas melhores noites desde o começo do relacionamento se não fosse a visão de minutos antes, no banheiro da colônia de férias. No caminho até meu quarto, a imagem da rola do Denis não saía da minha cabeça. Até bati com o pulso três vezes na testa pra ver se chacoalhava os pensamentos. Chegando no quarto, me deparei com a Sandra sem roupa na cama e poucas luzes acesas.
Enquanto a chupava, ouvia os gemidos de Serginho, Serginho, enquanto a pica do Denis insistia em me atormentar mentalmente. Não sei bem se fiquei de pau duro pelos gemidos da minha noiva, de quem eu conhecia todos os atalhos do corpo e sabia onde tocar e beijar pra deixá-la ainda mais entorpecida, ou se a inveja tocou meu íntimo e eu usava Sandra como desculpa pra satisfazer um desejo de ser quem eu não era. Preferi acreditar que a visão não interferiu no meu desempenho, nem aumentou minha vontade de foder com a Sandra. Ela ficava doida pra meter em lugares diferentes, como no estacionamento do shopping, numa rua escura com os braços apoiados no capô do carro e até no banheiro da casa recentemente financiada pelo Denis. Ela disse que tava passando mal na festa, tinha bebido demais, fui levá-la pra vomitar no banheiro de cima, mas quando tranquei a porta ela abriu o zíper da minha calça e colocou meu pau na boca enquanto a Cris batia na porta pra saber se tava tudo bem com a amiga e eu disfarçava dizendo que sim, ia passar.
Voltei a pensar no Denis. No pau do Denis. Fiquei nervoso comigo, mas não podia parar. Gozei dentro e deixei uns arranhões a mais na Sandra, que depois deu risada quando conversamos e perguntou se tanta força era a vontade de convencê-la a ir pro meu apartamento de vez. Eu fui dormir e tive medo de sonhar com meu amigão sem roupas e sentir desejos incontroláveis durante o sono. Acordei com a Sandra em cima de mim, e eu de pau duro, e ela apoiando as mãos nos meus peitos. Era de manhã, mas faltava um tempinho pra aproveitar o café da colônia. Lembrei que combinamos o café juntos, gozei em jejum. Tirei as costas da cama e ainda dentro da Sandra demos um beijo demorado.
Os homens no banco da frente, as mulheres no banco de trás. Repetimos a regra da ida porque ficava mais fácil de conversar sobre os assuntos em comum. O Denis adora dirigir e não se incomodou quando eu pedi pra dormir um pouco, tava cansado, fazia tempo que não viajava assim.
Com a cabeça encostada pro lado, disfarcei e entreabri um olho, mirando sua bermuda tactel. Ele tava sem cueca, dava pra perceber, como também dava pra perceber onde tava a cabeça do seu pau com o reflexo do sol batendo na estampa colorida e volumosa, já que não existe maneira de esconder um pinto enorme como o dele e também não há motivos prum homem de verdade disfarçar o quão pirocudo é.
Em alguns momentos, senti raiva do Denis, em outros, senti pena de mim. Dele, me injuriava saber que nunca seria capaz de alcançá-lo, de mim, sentia pena por nunca ter me dado conta que seu sucesso com a mulherada desde cedo e o jeito alegre tinham a ver com a certeza de que era privilegiado entre os meros mortais. Um homem com o pinto daquele tamanho não tem desculpas pra ser infeliz. Se a Cris lhe desse um pé na bunda, o que a partir daquela viagem tive mais certeza que jamais aconteceria, ele arrumaria outra fácil, fácil. Se o Denis me impressionou com aquela tora parda e circuncidada, ressaltando ainda mais a cabeçona roxa e intimidadora, deveria causar tremor em mulheres com a vontade de meter a boca ou sentar naquilo tudo o mais rápido possível.
Chegando no meu apartamento, a Sandra falou sobre o quanto a viagem foi ótima pra gente ficar mais juntinhos e ela entender melhor o meu lado, do quão corajoso eu era pra assumir que a desejo pro resto da vida e que esse próximo passo era fundamental pro relacionamento. Transamos pelo quarto dia seguido, o que não acontecia havia algum tempo.
Eu até deveria ser grato ao Denis, mas isso me faria lembrar dele sem roupa e esbanjando um pau gigante na minha frente outra vez e já não conseguia parar de pensar naquilo, mesmo nas horas do sexo. Enquanto comia Sandra numa posição em que ela não tirava os olhos da minha cara, me sentia parado no trânsito com meu 1.0, olhando pela janela e me deparando com um importado caríssimo, disparando à frente ao sinal verde. Dirigido pelo Denis.
Na sexta-feira, faltava uma hora pro almoço e o Denis me mandou uma mensagem. Tava agarrado num trampo, talvez saísse um pouco mais tarde e nos convidou pra jantar. Queria saber um pouco mais sobre a repercussão do fim de semana na colônia. Sempre discreto e educado, talvez nunca tenha se comportado de um jeito espalhafatoso por saber que a natureza lhe brindou com o melhor dos exageros.
Marcamos pro sábado a noite da pizza, com cervejas e quem sabe um filme na sua casa. Já não me sentia confortável pra discordar em nada do Denis e ele até me perguntou se eu não daria outra ideia, porque sou sempre tão cheio das ideias.
Me despedi, olhei sua foto de perfil e nela o abraço por trás da Cris, usando uma sunga na beira da piscina da colônia de férias, como se quisesse esconder o que qualquer um faria questão de mostrar. Falei com a Sandra sobre o jantar do dia seguinte e ela curtiu a ideia porque queria outra noite como a da colônia, mas agora no nosso apartamento. Nosso, ela ressaltou. Ouvi o barulho de um carro acelerando lá fora, olhei pela janela e tive a nítida impressão que era um modelo igual ao do Denis. Voltei a trabalhar e olhei pro relógio, esperando o almoço de mais uma sexta-feira, dessa vez sozinho com meus pensamentos.